quarta-feira, 1 de junho de 2011

Métodos Semi-empíricos - cuidado

Olá, muito tempo depois resolvi fazer um post. Pretendo fazer uma rápida comparação entre os métodos semi empíricos que o MOPAC possui,e utilizando o Gabedit 2.3.7 como interface gráfica. Tudo começou quando precisei calcular as cargas parciais para um ligante (uma pequena molécula com atividade biológica) e pra isso fiz algumas optimizações de geometria usando métodos semi-empíricos e encontrei uma divergência nas geometrias de equilíbrio obtidas. Aqui vamos abordar um exemplo bem mais simples, utilizando a molécula de anilina como estudo de caso.

Figura1: Estrutura da molécula de anilina.

A anilina é composta basicamente de um anel benzênico onde um do hidrogênio é substituido por um grupo amino (NH2). Não temos dúvida sobre a geometria do anel na molécula de anilina. Todos os carbonos supostamente são híbridos do tipo sp2 e portanto a geometria adotada é plana. Quanto a geometria do grupo NH2 ligado ao anel, basta olhar para os híbridos de ressonância da molécula como um todo :

Figura2: Principais híbridos de ressonância na molécula de anilina.

Note que as principais estruturas de ressonância apontam o nitrogênio com configuração SP2, devido ao suposto compartilhamento do par de elétrons não ligados, conjugado com o restando do anel.Pois bem, vejamos qual o resultado da optimização de geometria utilizando métodos semi-empíricos presentes no mopac2009:

Todos os métodos são capazes de predizer a geometria plana do anel, porém somente o RM1 (Recife model 1 ) foi capaz de reproduzir a geometria plana do grupo amino. Todos os outros métodos incluindo o PM6 levaram a uma optimização de geometria que aponta o nitrogênio do grupo amino com SP3.

Figura3: Divergência nas estuturas obtidas com diferentes métodos semi-empíricos.

Uma análise mais criteriosa pode ser feita facilmente dentro da interface do Gabedit, utilizando-se a ferramenta “measure” presente na barra de ferramentas do editor. Podemos verificar quão plano é o grupo NH2 para cada optimização, acompanhando o valor do do angulo diedro entre os átomos H[13], N[7], C[1] e C[6]. Onde zero, indicaria uma geometria plana.

Figura4: Cálculo do angulo diedro feito atravez da interface do Gabedit 2.3.7.


Tabela1: Valores para o angulo diedro Diedro H[13], N[7], C[1] C[6] para diferentes níveis de teoria:

Método

Diedro H[13], N[7], C[1] C[6]

AM1

-25.702810

PM3

-29.825696

PM6

-24.074015

RM1

-0.018868

Concluindo, é realmente formidável ter acesso a programas como MOPAC onde é possível determinar uma infinidade de propriedades de sistemas moleculares. Porém este post aponta um de muitos artefatos (resultados mal interpretados) que podemos obter. É importante que antes de executar qualquer simulação ou cálculo, conhecer bem o sistema em estudo. Lembre-se que trata-se de uma simulação e portanto esta tem objetivo de reproduzir algo que que podemos observar/explicar experimentalmente. Outro ponto importante é encontrar o nível de teoria mais adequado para o sistema que pretende-se estudar. Os métodos semi-empíricos utilizados neste post, foram em priore, parametrizados para reproduzir calor de formação (note que o MOPAC retorna os valores de energia em kcal/mol) e assim, outras propriedades podem não ser tão bem reproduzias.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Efeito da eletronegatividade em compostos orgânicos

Estive pensando em uma maneira de evidenciar o efeito da diferença de eletronegatividade em compostos orgânicos. Então fiz alguns testes bastante interessantes (e muito rápidos) usando Avogadro e MOPAC2009. A partir da molécula de metano, foram gerados; metilamina, metanol e fluormetano (seguindo a crescente ordem de eletronegatividade H, N, O e F para o substituinte). Os quatro compostos em questão foram então minimizados no programa MOPAC, usando o método PM6. A figura 1 mostra o mapa de potencial eletrostáticos para os 4 compostos.
Mapa de potencial elestrostático de superfície, para as moleculas; metano, metilamina, metanol e fluormetano. Azul representa um potencial positivo frente a aproximação de um carga pontual positiva (processo que requer energia), e vermelho, potencial negativo. Note o aumento da polarição da região do átomo de carbono frente a crescente eletronegatividade dos substituintes.

A ordem crescente na eletronegatividade do substituinte no metano tem um acentuado efeito na polarição do sistema.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Utilizando MOPAC - Benzeno

Okay, depois da geometria da molécula de benzeno, utilizando o método PM6 dentro do MOPAC2009 (gratuito para fins acadêmicos). Os “input files” foram gerados no programa Gabedit e as figuras feitas no Avogadro. O calculo dos orbitais moleculares aponta um gap (diferença de energia) entre o HOMO (orbital de maior energia ocupado) e LUMO (orbital de menor energia desocupado) de 10.2eV, bastante próximo do valor de referencias que encontrei que foi de 10.5.
Orbitais moleculares calculados para a molécula de benzeno com o método PM6 em fase gasosa, (a) orbital de maior energia ocupado, HOMO, (b) orbital de menor energia desocupado LUMO, o gap de energia calculado foi de 10.2 eV.
A densidade eletrônica calculada para a molécula de benzeno mostra uma baixa, porem não nula ocupancia no centro do anel, desmitificando o “mito do anel furado”. O calculo de potencial eletrotático de superfície (ESP), aponta valores negativos nas regiões internas do anel e valores positivos nas regiões dos átomos de hidrogênio (externas) frente a aproximação de uma carga pontual positiva (ex. Próton). Essas informações são coerente com o mecanismo que adição eletrofílica em anéis aromáticos, que jugere o ataque da espécie positiva (próton) à região conjugada rica em elétrons.
(a) (b)
(a) Curvas de densidade eletrônica, 99.0, 99.5, 99.9% de probabilidade de se encontrar os elétrons das molécula de benzeno, note que para a ultima faixa, (99.9) não existe “buraco” no centro do anel. (b) Potencial eletrotático de superfície (ESP), note que com a aproximação de uma carga pontual positiva (próton) é energeticamente viável na região central do anel (potencial negativo).
Pois bem, não tenho dúvidas que Gabedit, Avogadro e MOPAC2009 sejam excelentes ferramentas, não apenas de pesquisa científica mas também no ensino de química, são gratuitos para fins acadêmicos e educacionais e possuem uma vasta literatura disponível on-line de como serem bem utilizados.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Adições eletrofílicas

Foleando as páginas do livro de química orgânica do Solomons, deparei-me com as reações de adição eletrofílicas em hidrocarbonetos saturados. Este é um tópico relativamente básico tratando-se de síntese orgânica, e achei interessante fazer algumas especulação estruturais do que acontece. Haletos de hidrogênio tal como o cloreto de hidrogênio (HCl) adicionam-se a alquenos dando haleto de alquila em hidro-halogenação. Consideremos o mais simples dos casos, a reação de HCl com etileno que produz cloroetano1.

Reação de adição eletrofílica.

A reação ocorre em duas etapas, a primeira consiste no ataque da espécie positiva (ácido) à insaturação resultando em um intermediário contendo carga positiva, conhecido com carbocátion. Na segunda etapa, a espécie contendo carga negativa (base) ataca o carbono que predominantemente retem carga positiva completando a reação.


A primeira questão é, por que o proton ataca a insaturação e gera a espécie carbocátion ? Bem, a química de carbocátions é estudada desde final do século XIX, e é interessante como os químicos orgânicos da época, com teorias ainda tão rudimentares, apresentaram explicações bastante sofisticadas para esse problema. A lógica é relativamente simples, os átomos de carbono do eteno compartilham 2 pares de elétrons (ligação simples e dupla). Logo esta é uma região rica em carga negativa, o que confere um caráter de basicidade.

Para comprovar tal hipótese, calculei a densidade carga na molécula de eteno e a partir desta, um mapa de suscetibilidades de ataque eletrofílico, e um mapa de potencial eletrotático de superfície. Para isso utilizei o programa MOPAC/PM3 – dentro das plataformas Ghemical e Gabedit.

(a) (b) (c)


(a) Molécula de eteno na representação ball stick, (b) Mapa de suscetibilidade de ataque eletrofílico, onde azul representa alta suscetibilidade. (c) mapa de potencial eletrostático, a região em azul representa um potencial negativo frente à aproximação de uma carga pontual positiva.


Para os dois mapas as conclusões (assim como esperado) são redundantes, o ataque por parte da espécie positiva, se da na região da insaturação. Lembrando também que esta dupla ligação é um representação do HOMO (high occupied molecular orbital) na molécula de eteno e que esta diretamente ligado a reatividade desta região.


Orbitais de fronteira (HOMO) da molecula de eteno.

Outra questão interessante é sobre as características do intermediários formados. Uma vez que os carbocátions são espécies muito reativas e portanto de vida curta, de forma que não podem ordinariamente isolados e caracterizados. Utilizando os mesmo métodos semi empíricos anteriores fiz a modelagem do carbocátion gerado.


(a)


(b)
(a) Mapa de suscetibilidade de ataque nucleofílico, onde azul representa a mais alta suscetibilidade. (b) Representação com cutoff de 99% do volume, referente ao LUMO, (low unoccupied molecular orbital) o qual possui potencial negativo.

Por fim, o produto da reação é cloreto de etila. Note que a distância de ligação entre carbono e cloro é claramente maior do que carbono e hidrogênio ( da ordem de 0,8 Å maior), o que já era esperávamos que são átomos bem diferentes. Outra consequência é que agora temos uma composto com polaridade, onde o momento dipolo é de 8.7d ( a água, calculada com o mesmo método tem 17,5d).

(a)


(b)

(c)

(a) Molécula de cloreto de etila na representação ball stick, a seta em azul representa o vetor momento dipolo, (b) Mapa de suscetibilidade de ataque eletrofílico, (c) Representação com cutoff de 99% do volume Orbital de fronteira (HOMO).


O mapa de suscetibilidade de ataque eletrofílico aponto o cloro como principal aceptor de carga, porem, é interessante observa a presença do cloro altera a reatividade dos hidrogênios ligados ao mesmo átomo de carbono.

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Eletr%C3%B3filo

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Aprendendo um pouco mais sobre química orgânica estrutural usando Avogadro.

O software Avogadro, que é uma das minhas dicas do tópico “início”, é uma ferramenta bastante útil em disciplinas como química orgânica. Vou começar tratando de um caso simples, que será desenhar e minimizar a estrutura do n-butano ou simplesmente butano.

Vamos começar desenhando a molecula sem nenhum conhecimento prévio de química orgânica.

Modelo inicial

Não precisamos de muito conhecimento em química pra concluir que essa configuração para a molécula de butano esta errada. Mas por quê?

Em primeiro lugar os comprimentos de ligação C-C claramente diferem estupidamente uns dos outros, o que não deveria ser observado para uma estrutura desse tipo. Sabemos também, que por fazer apenas ligações simples (tipo sigma), os átomos de carbono deveriam apresentar geometria tetraédrica, idealmente, e não é o que observamos em tal estrutura.

Dentro do Avogadro, existe uma opção : Extensions> Optimize Geometry – para isso vou utilizar os parâmetros do campo de força MMFF94 (Merck Molecular Force Field 94), que é um “campo de força clássico”, onde os átomos e suas ligações químicas são tratados como sistemas do tipo massa mola.

Modelo com geometria optimizada.

A minimização usando o campo MMFF94 proporciona um modelo bastante razoável, Os comprimentos de ligação carbono-carbono estão da ordem de 1.5 Å, e ligações carbono-hidrogênio da ordem de 1.0 Å. Se olharmos agora para os ângulos de ligação dos átomos de carbono, encontraremos todos próximos de 109o.

Embora nosso o modelo seja bastante razoável do ponte de vista de comprimento de ligações e geometria dos átomos, se rotacionarmos o modelo e olharmos ao longo da ligação simples entre os átomos 2 e 6, veremos que a molécula esta na conformação gauche. O cáculo da energia para esta conformação segundo pro programa foi de -4,292 kcal/mol.

Configuração gouche obtida no processo de minização de energia para a molecula de butano usando MMFF94


Possíveis conformações que o butano pode assumir.

Consultando o livro de Química Orgânica sétima edição - Graham Solomons e Craig Fryhle, a conformação de menor energia, e portanto a mais provável, é a conformação do tipo “Anti”. Sendo assim rotacionei a ligação entre os átomos 2 e 6, de forma que a molécula ficasse próxima a conformação do tipo “Anti” e em seguida apliquei novamente o procedimento de minimização de energia.



Configuração anti, que representa o estado de menor energia pra esta molécula.

Onde a energia calculada pelo programa para esta conformação é de -5,076 kcal/mol. E portanto a diferença de energia entre as duas conformações, |ΔE| = |(Eanti - Egauche)| = 0,783 kcal/mol. Sendo o valor de referência 0.927 kcal/mol.

Mas por que que quando minimizamos a energia primeiramente não chegamos à conformação de menor energia?


A resposta é razoavelmente simples, basta olharmos para o gráfico de energia em função das possíveis configurações que o butano pode assumir.

Gŕafico de energia em função da rotação simples entre C-C, mostrando as possíveis configurações e suas respectivas energias.Ref; figura extraia de: http://chemistry.umeche.maine.edu/CHY251/Butane.html

Note que os máximos de energia são obtidos quando os átomos estão na forma eclipsada. Sendo que podemos observar para o gráfico três mínimos de energia, dois mínimos locais para as configurações gouche, e um mínimo global para a configuração anti. O processo de minimização como adotamos aqui, converge pra a região de minima energia mais próxima, sendo ela um mínimo local ou mínimo global.


quinta-feira, 8 de abril de 2010

Início

Okay, lá vai minha primeira (e espero que de muitas) postagem.

Começo com uma dica, para os estudantes/entusiastas das ciências químicas. Atualmente é possível ter acesso gratuitamente (nada de pirataria) a excelentes softwares, tanto visualizadores como programas que realizam cálculos robustos como minimização de geometria, cálculos de potenciais eletrostáticos etc... Para este blog utilizarei apenas softwares livres ou livres para fins acadêmicos, grande parte deles estão disponíveis nos repositórios do Ubuntu/Debian.

Na página: http://www.redbrick.dcu.ie/~noel/linux4chemistry/ você vai encontrar um lista quase interminável de softwares disponíveis (lembrando que muitos deles você também vai encontrar para windows, caso não utilize linux).

Minha lista de sugeridos para os novatos é:


Gabedit – é outra plataforma que visualiza, edita estruturas e faz interface com vários programas para calculos ab inicio e semi-empíricos. É opensource e também pode ser encontrado nos repositórios do Ubuntu.

http://gabedit.sourceforge.net/


Avogadro – é um visualizador bastante elegante, com uma série de recursos, e faz interface com firefly e MOPAC. É opensource e pode ser encontrado nos repositórios do Ubuntu/Debian.

http://avogadro.openmolecules.net/wiki/Main_Page


MOPAC2009 – para cálculos quânticos semi-empíricos, este software é livre para uso acadêmico e fácil de ser obtido. Não possui interface gráfica própria.

http://openmopac.net/


Firefly (antigo PC GAMESS) - pra cálculos quânticos ab inicio, este é um software de uso acadêmico livre, é muito robusto e rápido. Não possui interface própria.

http://classic.chem.msu.su/gran/gamess/index.html .

Ghemical 2.98 – é outro software livre com uma série de recursos (bastante didáticos), minimização de energias por campos de força, cálculos semi-empíricos (com MOPAC7) e ab inicio (Usando MPQC), cálculo de potenciais eletrotáticos entre outros, porem tende a consumir muito mais tempo de maquina que os demais o que o torno inviável para procedimentos mais exigentes.

http://www.uiowa.edu/~ghemical/